Depois de algumas centenas de milhares de vítimas e desalojados, quatro versões iniciais, da exigência de sete países em que não fosse aplicada a palavra “sanções” e de 13 votos a favor (entre eles os três países africanos com assento no Conselho, Argélia, Angola e Benin) e duas abstenções (China e Paquistão, que sempre se opuseram à ameaça de sanções), o Conselho de Segurança (CS) das N.U. consegue fazer aprovar a Resolução 1556(2004) que exige ao governo de Cartum medidas que acabem com o genocídio; esta palavra, no entanto, arredada do léxico da União Africana (UA), pelo que não surpreende que também o esteja da Resolução.
Ou seja, a Resolução exige que Cartum honrasse os compromissos assumidos com Kofi Annan e Collin Powell, em 3 de Julho, desarmar e neutralize as milícias árabes de Janjawid, puna severamente os responsáveis pelas acções violentas contra a população negra islâmica e animista de Darfur e autorize e facilite a actividade das organizações humanitárias (não sei como será possível dado que estas continuam a adoptar a proscrita palavra “genocídio”).
O paradoxo parece vir do palácio de Itamaraty, sede do Ministério de Relações Exteriores do Brasil, que somente fazem referência a um eventual embargo do comércio internacional de armas destinadas à região de Darfur, no Sudão.
De notar, ainda, que já na véspera a União Europeia (EU) tinha acordado com os sudaneses em reactivar o acordo celebrado no seio da UA, em 8 de Abril, e ouvido do representante sudanês que não admitiria a presença de militares estrangeiros, propostos por Londres, ou que em Darfur, contrariamente ao que divulgava a imprensa, não havia fome e que o seu governo, citado pela Panapress, "teria enviado cerca de quatro mil polícias a Darfur, para pôr termo às operações das milícias Janjawid".
A Resolução impõe trinta dias ao Governo sudanês para respeitar as exigências do órgão mais antidemocrático do Mundo (um país de entre os cinco, num total de quinze membros pode impedir a aprovação de uma Resolução, através do veto). Caso não as cumpra, o CS poderá fazer aplicar o artº. 41 da Carta da ONU, ou seja, aplicar medidas coercivas mas que não implicam o emprego de forças militares.
Só que os sudaneses não aceitaram de bom grado esta Resolução. Ameaçam considerá-la, consideram-na, uma ameaça ao Sudão, conforme ficou demonstrado na manifestação “espontânea” que, e só por mero acaso, era liderada por alguns membros do Governo de Cartum.
Por outro lado, não surpreende que a China tenha votado em branco, tal como não surpreende que a França e os EUA tenha sido comedidos quanto às palavras sanções e genocídio. Os três têm, directa ou indirectamente, interesses no petróleo da região. Os dois primeiros têm, mesmo, contratos celebrados com o governo sudanês.
Também a Liga Árabe, de que o Paquistão faz parte – e por isso se absteve – não permite qualquer intervenção armada no Darfur, excepto aquele a UA propôs enviara para a zona. Cerca de 2000 homens, cuja a única função é proteger menos de uma centena observadores militares que já se encontram naquela zona. A fazerem o quê, ainda ninguém o disse.
Apesar disso, Cartum diz que deseja cooperar com a comunidade internacional na resolução do problema tendo dito que já tinha enviado cerca de cinco mil polícias para a martirizada região. Também já o tinham dito nos finais de Julho. Por outro lado é interessante as palavras do chefe da polícia, de uma das regiões do Darfur, em que só dentro de uma semana vão começar a desarmar as milícias e sempre numa base numa premissa do voluntariado destas.
Enfim, ficaremos para ver porque... os dias começam a ser insuficientes para uma população que continua a ser martirizada, quer pelas milícias quer, principalmente, pela fome, conforme demonstram as fotografias com somos bombardeados diariamente. Daí a pergunta inicial. Senão, ao trigésimo dia já nada haverá.

Publicado no "Semanário África" de 16.Ago.2004
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